segunda-feira, 30 de março de 2009

Saudades de Casa

Acabo de receber este e-mail da minha mãe:
"Aos meus filhos, Edinho e Caíque. Li esta mensagem e me senti como o autor em muitos trechos dela. Com certeza os pais querem sempre o melhor, do melhor, para os filhos! A vontade é de sempre, creiam, não desgrudar de vocês, não deixar que nada os amole ou assuste e, principalmente, que vocês tenham sempre saúde, alegrias, paz, felicidade e amor. A dor no peito de ver um filho saindo de casa, como vocês o fizeram, chega a ser realmente dilacerante....Saudades a toda hora...sempre! O lugar à mesa, o quarto vazio, a comida predileta, a falta de "gritar " o nome (sei que grito...rssss), tudo faz lembrar vocês. Mas a gente sabe que a vida é assim, que o Gibran foi brilhante em seus pensamento e que, principalmente, embora os pais nunca entendam direito realmente: 'Vossos filhos não são vossos filhos, mas são os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma. Eles vem através de vós, mas não de vós. E embora vivam convosco, não vos pertencem. (...) Vós sois os arcos dos quais vossos filhos são arremessados como flechas vivas.' Continuando.....Primeiro foi o Edinho.....pensei que iria morrer! A dor foi sufocante! Dez anos depois, a mesma dor, tão sufocante quanto a primeira. E eu que pensei que ia "tirar de letra".....Afinal, pensava eu, já tinha acontecido uma vez! Mas filhos são sempre "únicos" para os pais....O amor por vocês é sempre incondicional!!! Para completar, um filho foi trabalhar fora e o outro foi estudar.....Não esperava pela "dose dupla"! Mas é a vida de vocês e o mundo os aguardava. Sei que vocês sempre se esforçaram, que estão bem e que são sempre motivo de orgulho para mim e para o pai de vocês. Ficar sem vocês neste últmos tempos tem doído muito. De repente me ver sozinha não foi fácil...Em geral não ter conversas, risadas, não ter a presença de alguém que fique um pouquinho comigo, que me ama, que me dê carinho, pode parecer algo egoísta, mas é a minha realidade. O que me conforta é saber que vocês estão bem, seja onde for. E, mais importante ainda é que sempre vou estar a esperar por vocês, porque.... 'O lar não é o lugar de se ficar, mas para onde voltar'. Voltem sempre! Amo vocês! Mamis."
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Este é o texto que acompanhou o e-mail:
A Lua que não dei !
Cecílio Elias Netto
Compreendo pais - e me encanto com eles - que desejariam dar o mundo de presente aos filhos. E, no entanto, abomino os que, a cada fim de semana, dão tudo o que filhos lhes pedem nos shoppings onde exercitam arremedos de paternidade. . . E não há paradoxo nisso. Dar o mundo é sentir-se um pouco como Deus, que é essa a condição de um pai. Dar futilidades como barganha de amor é, penso eu, renunciar ao sagrado.Volto a narrar, por me parecer apropriado à croniqueta, o que me aconteceu ao ser pai pela primeira vez. Lá se vão, pois, 45 anos. Deslumbrado de paixão, eu olhava a menina no berço, via-a sugando os seios da mãe, esperneando na banheira, dormindo como anjo de carne. E, então, eu me prometia, prometendo-lhe: 'Dar-lhe-ei o mundo, meu amor.' E não lhe dei. E foi o que me salvou do egoísmo, da tola pretensão e da estupidez de confundir valores materiais com morais e espirituais.Não dei o mundo à minha filha, mas ela quis a Lua. E não me esqueço de como ela pediu, a Lua, há anos já tão distantes. Eu a carregava nos braços, pequenina e apenas balbuciante, andando na calçada de nosso quarteirão, em tempos mais amenos, quando as pessoas conversavam às portas das casas. Com ela junto ao peito, sentia-me o mais feliz homem do mundo, andando, cantarolando cantigas de ninar em plena calçada. Pois é a plenitude da felicidade um homem jovem poder carregar um filho como se acariciando as próprias entranhas. Minha filha era eu e eu era ela. Um pai é, sim, um Pequeno Deus, o criador. E seu filho, a criatura bem amada.E foi, então, que conheci a importância e os limites humanos... Pois a filhinha - a quem eu prometera o mundo - ergueu os bracinhos para o alto e começou a quase gritar, assanhada, deslumbrada: 'Dá, dá, dá...' Ela descobrira a Lua e a queria para si, como ursinho de pelúcia, uma luminosa bola de brincar. Diante da magia do céu enfeitado de estrelas e de luar, minha filha me pediu a Lua e eu não lhe pude dar.A certeza de meus limites permitiu, porém, criar um pacto entre pai e filhos: se eles quisessem o impossível, fossem em busca dele... Eu lhes dera a vida, asas de voar, diretrizes, crença no amor e, portanto, estímulo aos grandes sonhos. E o sonho da primogênita começou a acontecer, num simbolismo que, ainda hoje, me amolece o coração. Pois, ainda adolescente, lá se foi ela embora, querendo estudar no exterior. Vi-a embarcar, a alma sangrando-me de saudade, a voz profética de Kalil Gibran em sussurros de consolo:'Vossos filhos não são vossos filhos, mas são os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma. Eles vem através de vós, mas não de vós. E embora vivam convosco, não vos pertencem. (...) Vós sois os arcos dos quais vossos filhos são arremessados como flechas vivas.'Foi o que vivi, quando o avião decolou, minha criança a bordo. No céu, havia uma Lua enorme, imensa. A certeza da separação foi dilacerante... Minha filha fora buscar a Lua que eu não lhe dera. E eu precisava conviver com a coerência do que transmitira aos filhos: 'O lar não é o lugar de se ficar, mas para onde voltar'.Que os filhos sejam preparados para irem-se, com a certeza de ter para onde voltar quando o cansaço, a derrota ou o desânimo inevitáveis lhes machucarem a alma. Ao ver o avião, como num filme de Spielberg, sombrear a Lua, levando-me a filha querida, o salgado das lágrimas se transformou em doçura de conforto com Kalil Gibran: como pai, não dando o mundo nem Lua aos filhos, me senti arqueiro e arco, arremessando a flecha viva em direção ao mistério.Ora, mesmo sendo avós, temos, sim e ainda, filhos a criar, pois família é uma tribo em construção permanente. Pais envelhecem, filhos crescem, dão-nos netos e isso é a construção, o centro do mundo onde a obra da criação se renova sem nunca completar-se. De guerreiros que foram, pais se tornam pajés. E mães, curandeiras de alma e de corpo. É quando a tribo se fortalece com conselheiros, sábios que conhecem os mistérios da grande arquitetura familiar, com régua, esquadro, compasso e fio de prumo. E com palmatória moral para ensinar o óbvio: se o dever premia, o erro cobra.Escrevo, pois, de angústias, acho que angústias de pajé, de í­ndio velho. A nossa construção está ruindo, pois feita em areia movediça. É minúsculo o mundo que pais querem dar aos filhos: o dos shoppings... E não há mais crianças e adolescentes desejando a Lua como brinquedo ou como conquista.. Sem sonhos, os tetos são baixos e o infinito pode ser comprado em lojas. Sem sonhos, não há necessidade de arqueiros arremessando flechas vivas.Na construção familiar, temos erguido paredes. Mas, dentro delas, haverá gente de verdade?
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Mãe, confesso que não consegui conter as lágrimas ao ler o seu e-mail, que veio de maneira inesparada e tomou, por um momento, a minha atenção, no meio de todos os problemas normais do trabalho que corria para resolver. Queria que você soubesse que se hoje eu estou aqui, é por causa de vocês. E o que me conforta é saber que não importa o que aconteça, eu posso sempre voltar para casa, onde serei recebido sempre como um herói. Te amo. E morro de saudades da minha casa.

quinta-feira, 12 de março de 2009

João Carlos Martins

Ontem a noite eu fui dormir pensativo sobre a minha vida. Fui com o coração pesado, com um sentimento esquisito de impotência diante dos acontecimentos, de fragilidade diante das pessoas. Fiquei questionando se eu não deveria sempre pensar o pior das pessoas, pré-julgar os outros, partir do princípio de que todo mundo mente. Enfim, se eu não deveria olhar para as pessoas e ver o mal, sempre. Eu não sou assim, não consigo ser assim. Foi difícil admitir pra mim mesmo que eu sou ingênuo para as relações sócio-afetivas. Mas, como disse Leoni, "a verdade sempre vem bater a porta, a gente tenha ou não vontade". As vezes eu acho que a minha vida sempre foi muito boa, muito fácil, mas depois eu vejo que as vezes eu é que a conduzi de maneira superficial, achando que os problemas poderiam vir e ir sem que tivesse que enfrentá-los. Era só ignorar e esperar passar. De fato, ainda acho que pode ser assim, mas descobri que desse jeito a gente acaba perdendo muito tempo e, na vida, cada minuto é precioso, e tempo não se perde. Assim, penso que a solução agora é aproveitar ao máximo o tempo, e, para isso, espero passar a encarar meus problemas pessoais de frente e sempre que eles ocorrerem. Chega da postura blasé. Hoje, pela manhã, vi que o João Carlos Martins estava na Ana Maria Braga falando justamente sobre a volatilidade, a efemeridade da vida. Ele que aos 26 anos era considerado o maior intérprete de Bach ao piano, cortou o braço com uma pedrinha enquanto estava jogando bola com os amigos e, com os nervos rompidos, perdeu os movimentos da mão direita. Para não se ver privado de sua paixão pelo piano, João Carlos se submeteu a longos tratamentos e conseguiu recuperar parte dos movimentos da mão. Entretanto, os esforços do pianista em seguir em frente acabaram por lhe punir com uma LER, uma vez que os dedos bons ficavam sobrecarregados. Desiludido, João Carlos vendeu todos os seus pianos e quis se afastar da músicas. Esquecer sua paixão. Mas Deus havia lhe dado um dom, e esse dom, de emocionar as pessoas, alegrá-las, fazer o bem pela música não poderia ser simplesmente deixado de lado. Após alguns anos, João Carlos retomou a profissão, dessa vez utilizando somente a mão esquerda, obtendo sucesso mundial. Entretanto, a a vida voltou a golpear João Carlos. Enquanto realizava um concerto em na Bulgária, o músico foi atacado com um golpe na cabeça que lhe fez perder parte do movimento de mãos novamente, e, ao se esforçar para continuar tocando, sofria com intensas dores em suas mãos, principalmente na mão esquerda. Desiludido, pensou que nunca mais iria tocar piano. Mas persistente e apaixonado que era, João voltou a se submeter a tratamentos, treinamentos e, mais uma vez encontrou uma forma de tocar, utilizando os dedos que podia em cada mão. O tempo foi passando e João Carlos, com cada vez mais dificuldade de se apresentar ao piano, resolveu tornar-se maestro, mesmo sendo incapaz de segurar a batuta ou virar as páginas das partituras dos concertos. Nesse caso, o pianista, agora maestro, faz um trabalho minucioso de memorizar nota por nota e ensina música, gratuitamente, para jovens carentes em São Paulo. Esse mesmo João Carlos que contou hoje que, no final dos anos 60, desfrutando de grande sucesso mundial, após um recital no Carnigie Hall em Nova Iorque, ao receber os cumprimentos de Salvador Dalí que estava na plateia, ouviu também a recomendação do mestre pintor: "Diga a todos que você é o maior intérprete de Bach, algum dia vão acreditar. Faz muitos anos que digo ser o maior pintor do mundo e já há gente que acredita". João Carlos pode não ser o maior pianista do mundo, mas com certeza tem uma das mais belas histórias de superação dos problemas da vida, que sempre encarou com otimismo e esperança. Toda vez que eu o ouço tocar, eu choro. É certamente uma das mais emocionantes experiências. Veja:

terça-feira, 10 de março de 2009

Lily Allen

Eu costumo dizer que quando o assunto é música, meu relógio anda com 20 anos de atraso. Ou seja, gosto de músicas lançadas há pelo menos 20 anos. Atualmente estou começando a revisitar os anos 90. Aliás, esta é a nova tendência das festas Flashback. Entretanto, de tempos em tempos, algumas coisas novas aparecem e me fazem renovar as esperanças pelo futuro criativo da música. Ainda dá para fazer coisa boa. E eu gosto disso, porque me sinto em compasso com o meu tempo. Pensando muito sobre o assunto, concluí que vou ficar triste no futuro se eu me descobrir, daqui há 20 anos por exemplo, um grande fã do NXZero, como eu sou, por exemplo, dos Smiths. Quando a banda nem mais existir, quando os membros morrerem, se aposentarem ou tiverem brigado, sendo que eu poderia ter acompanhado toda a movimentação, os lançamentos, os shows e a formação original, tudo agora. (Quero deixar claro que o NXZero foi apenas um exemplo). Mas é que já me aconteceu. Quando eu morei nos Estados Unidos, eu não gostava de música country. Aliás, eu odiava. E, entretando, era só o que fazia sucesso por lá. Hoje eu fico aqui correndo atrás dessas músicas com um louco na internet. E advinhem? Eu gosto delas por me fazerem lembrar do tempo em que eu morei por lá. As letras, o som, tudo me lembra aquela época da minha vida que não volta mais. Falando de artistas contemporâneos, eu logo que ouvi gostei da Amy Winehouse. Trouxe de volta o glamour e o som das divas da soul music, como Aretha Franklin, com o frescor do novo milênio. E com a vantagem de gostar de ska. Para quem duvida, basta ouvir a sua versão para Monkey Man, do Specials, que encerra o dvd Back to Black. Gostei também da Joss Stone, da Duffy, mas achei todas essas menores que Amy. É sempre assim quando é moda. Aperece o precursos e os seguidores, geralmente de segunda e terceira linha. Estamos vivendo a moda das divas cantoras na Inglaterra e acho que muitas do mesmo tipo ainda virão. Hoje eu quero destacar o álbum "It´s Not Me, It´s You", da Lily Allen, lançado no último dia 9 de fevereiro. Até ontem a noite eu acompanhava a carreira dessa cantora apenas porque ela tinha a mania de aparecer de top less nas praias e piscinas do mundo, e isso virava notícia no Terra e Globo.com. Mas lendo as críticas sobre o lançamento desse disco, vi que os críticos diziam que a cantora havia deixado o ska de lado. Aí eu pensei: ela fazia ska? Gostando de ska como eu gosto, corri atrás e vi que sim. Era ska. Mas um ska 2009. Ska com batida de hip hop, com vocais de rap, com samplers de música jamaicana dos anos 60, rocksteady. Ou seja, percebi que o ska que eu conhecia estava também parado no tempo, e se o ska fizesse sucesso hoje, soaria assim. O No Doubt hoje seria assim. O disco do qual eu trato hoje realmente não é ska. A inspiração é New Wave e é muito bom. Eu me apaixonei por uma música em especial nele, chamada Fuck You. Não é novidade nenhuma pra quem que conhece que eu gosto de música com palavrão, daí o meu gosto pelo funk carioca. Nesse caso, Lily Allen conseguiu uma melodia linda, alegre, contagiante, típica daquelas músicas bobinhas dos anos 60 (na verdade, é um sampler de Chain Reaction, gravada por Diana Ross), com introdução digna das melhores música dos Carpenters e a letra, surpreendentemente, crítica e nervosa. O legal é que a letra não tem nada a ver com a melodia da música. Escrita, segundo a cantora, como um protesto contra o BNP (British National Party), um partido de extrema direita da Inglaterra. Escutem Fuck You e vejam que, na música, algumas vezes, a melodia pode não ter nada a ver com a letra e mesmo assim a música ser ótima. A partir de hoje, acompanho a carreira musical de Lily Allen.